Sinimail nº 36/2023 – 26/10/2023
Os créditos de carbono no setor da construção pesada
O contexto que está ligado diretamente ao mercado de carbono é o do aquecimento global. Ao se falar sobre mercado de carbono, falamos sobre o mecanismo de desenvolvimento limpo, que apresenta duas possibilidades, uma ligada à necessidade de alguns grandes poluidores reduzirem suas emissões, e a outra à possibilidade da compra de cotas para que a empresa consiga se manter dentro de metas estabelecidas.
O Brasil entrou nessa política de créditos de carbono de uma forma voluntária, muito mais como alguém que venderia créditos por ter florestas, principalmente áreas preservadas e que poderiam gerar créditos de carbono, servindo para compensar emissões dos países desenvolvidos.
O Brasil concordou a partir de 2015, no Acordo de Paris, em reduzir emissões. Isto já tem como consequência o desenvolvimento de uma agenda nacional, com o compromisso de reduzir em até 50% as emissões de gases até o ano de 2030 e a meta de missões neutras até 2050.
A redução dos níveis de emissão de carbono é um assunto preocupante ao setor da construção pesada. Segundo dados da ONU, de 2021, o setor da construção em todos os seus modais é responsável por 37% das emissões de gases do efeito estufa em nível mundial.
Para discutir o tema, o SINICESP promoveu encontro em sua sede, com Fabiane Tessari Lima da Silva, mestre em Direito dos Negócios pela FGV/SP e fundadora da empresa InCarbon.
Na abertura do evento, realizado no dia 24 de outubro, o presidente do SINICESP, Luiz Albert Kamilos, disse que as alterações climáticas têm se manifestado com maior intensidade nas últimas décadas, tornando-se uma preocupação global.
Fenômenos extremos climáticos são observados com maior frequência, e muitos desses eventos são relacionados ao aumento das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera.
Dentro deste cenário, as empresas desempenham um papel significativo, pois são, em grande parte, responsáveis pelas emissões industriais.
Para Kamilos, compreender a importância em reduzir as emissões é essencial para combater as mudanças climáticas e garantir um futuro sustentável.
Em nível empresarial, muitos fatores devem ser levados em consideração, como as fontes de emissão, a estrutura organizacional e os níveis de maturidade dos parceiros envolvidos.
Segundo Fabiane Tessari, hoje há uma consciência de que é urgente reduzir as emissões de gases e criar mecanismos capazes de capturar carbono da atmosfera. Da mesma forma em que há consciência de que precisamos reduzir emissões, é concordância global de que o incentivo para isso vai ser de mercado, com novos estímulos econômicos para a redução de gases do efeito estufa.
Gargalos e oportunidades
Especificamente na construção pesada, os gargalos e os problemas relacionados com as emissões também se mostram como oportunidades. Temos as emissões relacionadas aos insumos que são usados na construção e isso é muito mais uma responsabilidade do fabricante do que das empresas, da construção propriamente dita.
Quando olhamos para os insumos, temos a oportunidade de utilização de elementos de tecnologia para um controle maior da quantidade de produtos que entram nas obras, evitando desperdícios, não só na forma de resíduos, mas também nos métodos de aplicação dos materiais. Quanto aos resíduos, precisamos conseguir, no âmbito da gestão e aplicação de métodos, a redução do volume de resíduos que são gerados.
No cenário da descarbonização do setor da construção pesada, não podemos desprezar a questão da gestão dos materiais, que são os maiores geradores de emissões de gases nocivos à natureza.
Há também outro aspecto a ser analisado, na implantação da obra, que se refere à gestão que pode promover a redução do consumo de água, energia e combustíveis. Existem sistemas para ajudar nesse processo, mas há ainda, segundo Fabiane Tessari, uma desinformação sobre o investimento em tecnologia necessário para atingir as metas como redução de insumos e tempo de realização de obra.
Mercado de Carbono
Nesse momento, o mercado de carbono no Brasil é voluntário, ou seja, não existe obrigação legal de nenhum setor de reduzir emissões ou compensar as emissões de gases do efeito estufa. Os créditos de carbono na atualidade podem ser utilizados apenas no caso das florestas, nas questões relacionadas com proteção, preservação e reflorestamento, constituindo-se ainda em um mercado voluntário, sem regulação.
Já existe, desde 2009, uma política nacional que é voltada à redução de emissões. Hoje, há o Projeto de Lei 412/2022, que já saiu do Senado e está, agora, na Câmara dos Deputados, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE).
Há a possibilidade de que a nova lei (412/2022) seja aprovada até o início da próxima Convenção do Clima, a ser realizada em dezembro, em Belém, no Pará. O projeto em questão determina regras para o mercado regulado de carbono brasileiro, com normas para todos os setores, menos para o agronegócio.
Na prática, depois de aprovada, a nova lei determinará que pessoas físicas ou jurídicas que emitam é 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente por ano (tCO2e) deverão reportar as suas emissões, com a obrigação de fazer um inventário de emissão de carbono.
Os emissores acima de 25 mil toneladas/ano vão ter que fazer uma conciliação periódica, comprando cotas de quem conseguiu se manter abaixo dessa meta, até mesmo de empresas de outros setores. Aqueles que conseguirem gerar cotas, créditos dentro desse mercado, vão poder vender esse excedente, não só aqui dentro do Brasil, mas fora também.
Para Fabiane Tessari, o setor da construção pesada terá ganhos, pois a redução das emissões vai significar diretamente a redução dos custos operacionais. A realidade de que o mercado será regulado, e que surgirão essas obrigações, pode ser enxergada como uma oportunidade para que aqueles que estão atentos em reduzir as suas emissões possam perseguir a meta de diminuir mais do que a norma exige e, com isso, ter um crédito para vender e transformar em receita adicional.
Ainda não estão definidos quais serão os níveis de cota específicos para cada setor industrial. O projeto de lei em tramitação, após aprovado, dá um prazo de dois anos para as adequações e definições das metas setoriais.
Inventário de Emissões
A primeira obrigação para o novo cenário do mercado de carbono é a realização de um inventário de emissões. Ele é formulado por meio de ferramenta internacional já existente, o Protocolo GHG (Greenhouse Gas Protocol ), compatível com as regras do sistema ISO. O GHG realiza as medições por meio de 6 sistemas de protocolos que envolvem as filiais e a participação societária, a definição das emissões diretas e indiretas, seleção da metodologia, coleta de dados, cálculo das emissões e formalização de relatório.
Outro importante aliado na identificação das emissões de gás carbônico é o Sistema de Informação do Desempenho Ambiental da Construção – SIDAC, que está criando uma base de dados nacionais que poderão ser usados nos relatórios ambientais da construção. O sistema é mantido por instituições acadêmicas e entidades ligadas ao setor da construção e pelo poder público.
O SIDAC permite identificar o impacto ambiental do uso de produtos, comparar opções, auxiliar na tomada de decisões sob o ponto de vista ambiental avaliar indicadores ambientais e divulgar os resultados para a sociedade.
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